Os últimos dias da pré-candidata do PT à sucessão presidencial, Dilma Rousseff, nos quadros do governo Lula, foram marcados por duas abordagens políticas que devem se intensificar na medida em que a campanha avançar. Ambas fazem parte da tática eleitoral concebida pelos articuladores petistas para impulsionar a candidatura da ex-ministra da Casa Civil. Uma, cada vez mais explorada, é a “humanização” da candidata. Desde que Dilma foi diagnosticada com um câncer linfático e teve que submeter-se a tratamento contra a doença, aliados enxergaram no infortúnio uma oportunidade para demonstrar a faceta lutadora e aguerrida da então ministra no campo pessoal, tendo em vista que estas características já se destacavam no campo político.
A mudança, planejada para amenizar a imagem de sisuda ostentada por Dilma até então, é gradual. Começou pela adoção de um tom mais leve em entrevistas, no cumprimento de agendas oficiais e, principalmente, em reuniões de articulação com aliados. Ficou clara no discurso de despedida da ministra do governo, permeado, em seus pontos mais agudos, pela voz embargada e contenção de lágrimas. E deve se aprofundar até outubro, tendo em vista que a campanha petista planeja reservar parte dos programas de propaganda eleitoral para apresentar a ser humana Dilma ao brasileiro: suas raízes regionais, gostos pessoais, peculiaridades e histórico familiar.
A aposta na humanização é justificável não só para criar uma contraposição ao perfil mais conhecido da ministra. A simples fama de “durona”, por si só, não pode ser traduzida como uma fragilidade eleitoral. A tática é, na verdade, uma opção coerente com a dinâmica dos processos de decisão de voto contemporâneos. Sob o impacto da midiatização das campanhas, do exacerbado individualismo e do enfraquecimento das divergências programáticas mais significativas entre as forças partidárias protagonistas, as características pessoais dos candidatos se consolidaram como um dos principais critérios utilizados pelo eleitor no momento de definir o voto. Logo, convém ao interessado em atrair o sufrágio popular que o conjunto de elementos associados a sua personalidade, estilo e forma de se relacionar e comunicar seja percebido como um atributo positivo por parte do eleitorado.
O chamado carisma, muitas vezes, é utilizado de maneira grosseira em explicações simplificadoras de resultados políticos muito mais complexos do que aqueles derivados da imagem pessoal de determinado líder. Isso não significa, contudo, que não tenha papel fundamental a desempenhar em uma campanha presidencial. O PT, talvez mais do que qualquer outro partido brasileiro, sabe bem disso. Entende que não há como desvincular, ao menos não em totalidade, seu sucesso eleitoral da estrela maior do partido, o presidente Lula. E que muito da capilaridade que Lula consolidou junto ao eleitorado, hoje, pode ser explicada pela capacidade do presidente de se dirigir diretamente às massas populares.
De maneira complementar, o outro elemento que o campo governista tentou realçar na despedida de Dilma foi, justamente, o lado mais gerencial da ex-ministra. Neste aspecto, contudo, talvez a estratégia do Palácio do Planalto não tenha sido tão eficiente. O propalado lançamento da segunda versão do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC 2), uma das principais plataformas de campanha da petista, expôs fragilidades da candidatura que a oposição certamente tentará explorar ao longo da campanha. Entre as principais, o caminho relativamente extenso que ainda precisa ser percorrido para que a primeira versão do programa possa ser apresentada como concluída, as lacunas na transparência do programa e no monitoramento de sua execução e a inclusão, no conjunto da nova etapa, de projetos e iniciativas governamentais tão amplas e variadas que aparentemente desconexas e potencialmente desconfiguradoras de objetivos. Antes, o PT temia que Dilma fosse atacada na campanha como uma técnica de perfil administrativo sem a habilidade política ou humana necessária para a condução de um país como o Brasil. Em uma eleição acirrada como a que se desenha, no entanto, os flancos abertos a despertarem inquietações se alteram velozmente.