Faltam.....

O eleitor indesejado

Por Mauro Santayana

Segundo os jornais, o nome do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso foi excluído da lista dos possíveis oradores no lançamento da candidatura do governador José Serra à Presidência da República, no dia 10. De acordo com as mesmas fontes, o outrora festejado líder, mais do que ajudar, poderá prejudicar o governador de São Paulo.

É provável certo exagero na informação. O ex-presidente continua a ser um homem elogiado por setores das elites econômicas, que nele veem o physique du role do estadista perfeito. É poliglota, visita universidades estrangeiras e circula com familiaridade pelos corredores da Sorbonne, de Oxford e Harvard, onde cruza, por acaso, com grandes mestres. Há quem defenda a ideia de que o intelectual paulista está acima da maioria da gente brasileira, despreparada para ouvi-lo e entendê-lo. Certa vez, acutilado pelo tédio, queixou-se de que somos um povo de caipiras.

Para lembrar o poema de Bilac, nem todos temos ouvidos capazes “de ouvir e entender estrelas”. Para ouvi-las, adverte o poeta, é preciso amá-las. Talvez não amemos o grande líder, como é devido, e por não amá-lo, não o entendamos. Não se compreende, por exemplo, que o grande intelectual se meta nas articulações de seu partido em busca de apoio, como fez recentemente, no caso do Distrito Federal. Podemos admitir que ele, em busca do minuto de televisão de um pequeno partido, tivesse pretendido ajudar. Mas, no critério de seus astutos companheiros de partido de São Paulo, esse adjutório pode surtir efeito contrário.

É natural – e humano – que o professor Fernando Henrique Cardoso não se desgarre da nostalgia do poder. Todos os que o experimentaram guardam do mando memórias agradáveis, como aquelas dos amores juvenis. Mandar é crescer sobre suas próprias dimensões, multiplicar-se na obediência que lhe prestam os outros, aumentar sua presença no mundo: é prelibar esse crescimento nas estátuas normalmente erguidas para ampliar, na posteridade, o espaço que o corpo ocupou em vida.

De vez em quando sua humana vaidade escorre pela língua, e ele se qualifica como um líder nacional. O problema é medir a real abrangência dessa liderança. Ela é normal em alguns círculos acadêmicos e no grupo que o acompanhou nos dois mandatos presidenciais. Provavelmente não tenha peso suficiente para inclinar a balança eleitoral em favor da candidatura da oposição ao presidente Lula.

O fato é que, nesta altura do processo sucessório, as duas candidaturas conhecidas ainda se encontram de velas quietas. Falta-lhes o vento do entusiasmo. A candidatura da ministra Dilma Rousseff se move sob o sopro presidencial, mas o barco ainda passeia em águas costeiras. Como sabem os veteranos, a viagem eleitoral começa para valer logo depois das convenções partidárias, nos 90 dias que antecedem a abertura das urnas. O mesmo ocorre com a caravela da oposição.

Mais do que a provável e subjetiva reação popular contra o ex-presidente, pesa-lhe a insistência em considerar o seu governo melhor do que o do sucessor. Milhões de brasileiros têm sólidas razões para se sentirem mais felizes hoje do que há oito anos. Isso não significa que o presidente Lula seja o messias enviado pelo Todo Poderoso para redimir a gente brasileira. Seu governo tem erros, mas – e isso é o que interessa – eles são de segunda importância em um confronto eleitoral. Assim, tanto Serra, quanto Aécio, sabem que negar acertos ao atual governo é bater-se contra a realidade, o que a razão política proíbe.

Pode ser que se trate de ingenuidade, mas há, quase tocável pelos dedos, a percepção de que, na atual campanha, de pouco valerão os efeitos especiais do palanque eletrônico. Os eleitores estarão de ouvidos mais atentos aos substantivos do que aos adjetivos; de olhos menos interessados nos efeitos plásticos do écran. Nos anos 60, Affonso Arinos de Mello Franco, filho, dizia, a propósito da oposição alienada, que, na visão da UDN, o povo comia habeas corpus. Hoje podemos dizer que tendo escapado, com Lula, da dieta do feijão com farinha, os pobres estão mais preparados para defender o que já conquistaram.
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E LULA engoliu a oposição...

A política brasileira produziu um fenômeno único na América Latina e talvez no mundo: o carismático presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua administração, que gozam de 84% de popularidade depois de seis anos de governo, engoliram a oposição. E não o fizeram com métodos antidemocráticos, mas sim apropriando-se de suas bandeiras. Já se sabia que Lula é um gênio político, que soube vencer as reticências no núcleo do seu próprio partido, o Partido dos Trabalhadores. De fato, dispõe-se a eleger uma mulher, a ministra Dilma Rousseff, como sua sucessora na candidatura à Presidência em 2010, apesar de ela nunca ter disputado eleições e não ser um personagem excessivamente grato ao PT. Mas o que ninguém jamais imaginou é que ele seria capaz de eliminar democraticamente a oposição. Tanto a de direita como a de esquerda.

Como conseguiu? Com uma política que, pouco a pouco, foi escavando o chão sob os pés dos seus opositores.

Cortou as asas da direita mediante uma política macroeconômica neoliberal que está lhe proporcionando bons resultados nestes momentos de crise financeira mundial graças às reservas acumuladas.

Ao mesmo tempo, pôs rédea curta nas pretensões de alguns dos movimentos sociais mais radicais, como o dos Sem Terra (MST), cujas ações têm criticado tachando-as de ilegais e instando-os a respeitar a lei em vigor.

E manteve uma política de meio ambiente das mais conservadoras, algo que agrada aos latifundiários e aos grandes exportadores, que formam o núcleo mais direitista do Congresso.

Também freou as esquerdas. Conseguiu fazer calar a esquerda minoritária com uma política voltada para os estratos mais pobres do país, o que fez com que seis milhões de famílias passassem às fileiras da classe média baixa, abandonando seu estado de miséria atávica.

Abriu o crédito aos pobres, que agora, com pouco dinheiro, podem abrir uma conta no banco e ter um cartão de crédito - o que os converte em partícipes da roda da economia nacional.

Para a outra esquerda, a moderada, também tornou as coisas difíceis. Hoje em dia, para o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), a agremiação oposicionista com maiores possibilidades de ganhar as próximas eleições porque conta com dois grandes candidatos (os governadores de São Paulo, José Serra, e de Minas Gerais, Aécio Neves), é mais difícil fazer oposição. Os dois aspirantes do PSDB sabem que não poderão ser eleitos contra Lula. Por isso, só falam, como acaba de fazer Aécio Neves, de uma era "pós-Lula", com um projeto de nação que aporte algo novo ao projeto do presidente, que já goza do consenso da grande maioria do país.

Desde o primeiro dia de sua chegada ao poder, Lula tem mantido Henrique Meirelles, do PSDB, como presidente do Banco Central. Conservou e ampliou o projeto social "Bolsa Escola", criado pelo PSDB, batizando-o como "Bolsa Família". Esse plano ajuda hoje 12 milhões de famílias e nenhum partido da oposição se atreveria a criticá-lo. Desde seu primeiro mandato, Lula não só demonstra ter sabido congregar apoios de 12 partidos ao seu governo, como até o momento logrou manter amizade com os candidatos opositores Serra e Neves.
Ambos, além disso, desfrutam de boas relações com o PT, e inclusive não descartam governar junto ao partido de Lula se chegarem ao poder.

Mas não há realmente espaço para a oposição no Brasil? Porque, se assim fosse, haveria quem considerasse isso um grave obstáculo para uma autêntica democracia. Poderia haver, segundo vários analistas políticos, como Merval Pereira, mas o problema está no fato de que a oposição se assustou com a popularidade de Lula. Há até políticos opositores, sobre tudo dos governos locais, que buscam uma foto junto a Lula para ganhar pontos com seu eleitorado.

Se a oposição desejasse, dizem os especialistas, poderia exigir de Lula que levasse a cabo as grandes reformas de que este país ainda necessita para decolar na cena mundial, como a reforma política (é possível governar com 30 partidos no Congresso?); a fiscal (Brasil é um dos países com maior carga tributária: roça os 40%); a de Segurança Social (Lula só a realizou em parte e, apesar de um escândalo de subornos a deputados para que votassem a favor, ficou pequena); a agrária (não saiu do papel); a da educação (no Brasil ainda não é obrigatório o ensino secundário e a qualidade deste é considerada como das piores no mundo); e, por último, a penitenciária (os suicídios dos presos aumentaram no ano passado em cerca de 40%).

Artigo publicado no jornal El Pais
JUAN ARIAS é jornalista.
© El País.

Agradecimentos!

Agradeço, de coração, a comadre Ozita e a meus irmãos Ruth Helena e Walter Vaz Jr. pelo apoio, no Encontro Estadual. Walter fotografou e Ruth filmou. Sem eles não seria possível tudo o que está aqui no blog!
Bjs e valeu!